Livro ‘A Eleição dos Bichos’ mostra como se escolhe
um governante.
Fonte: Portal Catraquinha / Lunetas

O rei Leão pensa que pode mandar sozinho em toda a floresta.
Quando ele resolve desviar o rio para fazer uma piscina na sua toca,
os bichos convocam uma eleição.
Na floresta, a soberania rola solta, e o Leão manda e desmanda no pedaço.
Para piorar, o rei tem uma ideia bastante antidemocrática, e resolve desviar o curso de um rio para construir uma piscina na própria toca.
Revoltada, a bicharada convoca eleições gerais para escolher um representante que realmente a represente. Esse é o cenário do livro “A eleição dos bichos“, lançamento da Companhia das Letras que chega em momento oportuno, às vésperas da disputa eleitoral.
A partir de hoje, TVs e rádios do Brasil todo passam a exibir o horário eleitoral, e as crianças, é claro, terão muitas perguntas. Para estimular esse diálogo aberto em casa, o livro fala sobre política de forma leve e honesta. No final da história, a publicação traz um Glossário em linguagem simples para os pequenos, explicando palavras como democracia, eleitor e urna.
No livro, os bichos já estavam mais do que cansados dos abusos de poder do Leão.
Quase uma espécie de “Revolução dos bichos” (George Orwell, 1954) para crianças, a autoria do livro é do Estúdio Rebimboca – formado por Larissa Ribeiro, André Rodrigues, Paula Desgualdo e Pedro Markun -, que em 2015 publicou o também infantil “Quem manda aqui?“, primeiro de uma série de livros sobre política para o público infantil.
Ambos foram construídos coletivamente, com contribuição valiosa das maiores interessadas, a criança.
Em entrevista ao Lunetas, o escritor Pedro Markun defende que os adultos precisam parar de fazer discurso de ódio para evitar que as crianças associem político a algo feio e errado. O livro faz parte desse desejo.
“Conversar sobre política é uma forma de se conectar com o comum.
De entender que você faz parte de algo maior”
Confira a entrevista!
Lunetas: Como foi ouvir ou trabalhar com crianças para este projeto?
Pedro Markun: A gente acredita que esse processo, coletivo e participativo, enriquece muito o trabalho. É uma forma de afinar a forma e o conteúdo com aquilo que realmente faz sentido para as crianças. Seguimos um processo muito parecido com o primeiro livro, uma série de oficinas – com crianças da rede pública e privada e diferentes faixas etárias.
Na oficina, a gente simulava uma eleição na selva, com cada criança adotando a mascara e persona de um determinado bicho – leão, joaninha, preguiça, cobra, macaco, coruja – os diferentes bichos se reuniam em grupos pra criar seu plano pra selva. É incrível como rapidamente a coisa toma forma.
Conceitos como partido, coligação, maioria simples, direitos de minorias aparecem sem que a gente precise falar sobre elas. É a partir da observação dessa vivência, dos comportamentos verbais e não verbais que a gente extraiu as referências do livro.
Lunetas: Teve financiamento coletivo também? Podem contar um pouco sobre a trajetória do projeto?
Pedro: Opa, teve sim. A gente acredita que esse é um modelo muito legal – pra além de viabilizar economicamente o trabalho de produção e as oficinas – cria-se uma rede de pré-leitores que estão envolvidos com o livro desde a sua concepção.
Fizemos o financiamento, realizamos as oficinas e aí seguimos para o processo de finalização já com o apoio da Cia das Letrinhas. “Para além de contar a história, fiquem atento às dúvidas e inquietações que a leitura desperta na criança”
Como funciona uma eleição?
O livro explica política para as crianças sem complicar.
Lunetas: Achamos interessante principalmente a parte dos cartazes de cada animal candidato. Como chegaram nessa ideia, e como ela comunica à criança conceitos importantes como democracia e representatividade, por exemplo?
Pedro: Nas investigações para o livro, a ideia do “santinho” se mostrou algo muito presente no imaginário sobre política. O André e a Larissa, na hora de ilustrar, fizeram uma extensa pesquisa de imagens buscando referências em diferentes períodos da nossa história política. Todos aqueles cartazes, aliás, são baseados em dizeres e formatos reais – readaptado pra realidade da floresta.
Lunetas – Que dicas vocês dariam para a mediação de leitura deste livro? Como ele pode ser aproveitado diante dessa guerra eleitoral que vivemos?
Pedro: Esse é um livro aberto. A história é mais fechada e linear que o “Quem Manda Aqui?, primeiro livro da série, mas ainda assim a gente fez o possível para deixar uma série de perguntas e possibilidades de diálogo em aberto. Para além de contar a história, fiquem atento às dúvidas e inquietações que a leitura desperta na criança.
Outra novidade desse livro, que a gente deve continuar adotando, é o Glossário – percebemos que muitas vezes as crianças não compreendem o sentido de uma palavra ou outra mas não perguntam, extraindo o sentido do contexto – ou mesmo ignorando por completo. Isso é muito legal, e muito do nosso vocabulário acaba sendo construído dessa maneira. Mas se o objetivo é mesmo falar de política – provocar ativamente sobre o significado de algumas daquelas palavras pode gerar boas conversas.
“Por todos os lados as palavras “política”, “eleição”, “presidente” ecoam pra elas”
Lunetas – Na opinião de vocês, qual o impacto de conversar sobre política
desde a infância?
Pedro: Conversar sobre política é uma forma de se conectar com o comum. De entender que você faz parte de algo maior, uma sociedade que tem regras e formatos que não surgem do nada, pelo contrário – são definidas por essa própria sociedade. Entender esse mecanismo é uma chave pra autonomia e pensamento crítico, valores que a gente acha super importante de trabalhar nas crianças.
Lunetas – Pensando nos eventuais feedbacks que possam ter recebido, como as crianças têm encarado a história, e como elas apreendem a proposta do livro?
Pedro: Acho que ainda é um pouco cedo, na verdade.
Só posso falar aqui de casa. O livro é tema recorrente, em parte porque fui eu que escrevi – mas essencialmente porque por todos os lados as palavras “política”, “eleição”, “presidente” ecoam pra elas.