Fonte: Afinando o Cérebro
O papel da família mudou muito no decorrer dos tempos. Até a Idade Média, sua função primordial consistia em garantir a conservação dos bens do grupo, sem uma preocupação mais específica com as necessidades de suas crianças. Hoje, a realidade é bem diferente.
A família tende a perceber, atualmente, seu papel de educadora no processo de desenvolvimento de seus filhos. Biasoli-Alves, Candana e Dias da Silva afirmam que a questão “estou agindo certo com meus filhos?” passou a ocupar um papel central nos últimos anos, uma vez que os pais estão revendo suas escalas de valores pela vivência de conflitos e contradições entre a forma como foram criados e a realidade do mundo atual.
Nesse cenário, a família é quem geralmente percebe distúrbios fonoaudiológicos na criança. Por isso, torna-se fundamental inclui-la no processo, convidando-a não apenas a fornecer o tratamento necessário, mas também a ter uma participação ativa, engajando-se, de fato, no tratamento.
Veja os benefícios que o engajamento familiar pode trazer para os resultados no tratamento de distúrbios fonoaudiológicos.
A importância do engajamento familiar no tratamento de crianças
Piaget, pensador que desenvolveu importantes teorias sobre o desenvolvimento humano, afirmou que o conhecimento é resultado da interação entre o sujeito e a realidade que o cerca – o seu meio.
No caso da criança, esse contato primeiro é realizado com seus pais, e o meio familiar passa a ser o primeiro agente socializador da criança. É o núcleo familiar, ainda, que será o responsável pelo lançamento dos fundamentos da formação da criança e do estabelecimento de seu padrão de comunicação e comportamento.
“O afeto é um regulador da ação, influindo na escolha ou rejeição de determinados objetivos e na valorização de determinados elementos, eventos ou situações por parte da criança” e que “em qualquer atividade humana, afeto e cognição são aspectos inseparáveis”.
Reforça-se, diante disso, a importância da participação, do envolvimento, do incentivo e do engajamento familiar para o sucesso de um tratamento fonoaudiológico de uma criança.
Como a participação familiar potencializa os resultados no tratamento?
É bastante conhecido o caso de Helen Keller. Já em seus primeiros meses de vida, a criança encontrava-se cega, surda e muda. Apesar de não saber exatamente como lidar com a questão, sua família não abriu mão de um tratamento que permitisse ao máximo o desenvolvimento da filha.
Sua mãe, inspirada por um relato do escritor Charles Dickens sobre a educação bem-sucedida de uma jovem surda, decide procurar um especialista de sua época. Helen Keller acabou sendo encaminhada a uma escola e lá encontrou Anne Sullivan, uma ex-aluna deficiente visual que se tornou sua tutora e ajudou em todo o processo de educação de Keller. Helen acabou tornando-se escritora, conferencista e ativista social reconhecida internacionalmente. Tudo isso porque seus pais persistiram na busca por um tratamento para a filha.
Esse caso de sucesso evidencia que, além do papel de identificadores de distúrbios,
os pais devem ter uma participação ativa em seu tratamento.
Alice Paige-Smith e Anna Craft, no livro O desenvolvimento da prática reflexiva na educação infantil, identificaram cinco tipos de papéis que os pais podem assumir na educação de seus filhos: apoiadores, aprendizes, professores, ajudantes e voluntários, criadores de políticas.
Nesse modelo, o papel protagonista que os familiares possuem é claro, dando proteção e condições para que a criança se desenvolva, facilitando e mediando seu processo de aprendizado e, ainda, realizando trocas e aprendendo com seus filhos – seja observando-os, interagindo com eles ou mesmo durante um tratamento profissional.
Ainda nesse livro, as autoras sugerem que para estimular o envolvimento familiar é preciso que a ênfase esteja em fazer dos pais “parceiros iguais e atuantes” e não apenas coadjuvantes do profissional que está auxiliando no desenvolvimento de seus filhos.
A compreensão dos pais a respeito das dificuldades e potencialidades da criança poderá ser o primeiro passo para envolvimento da família no tratamento fonoaudiológico. Quanto maior for o conhecimento a respeito das metas de curto e médio prazo do plano terapêutico, maiores serão as chances de uma contribuição efetiva dos pais na evolução da criança.
Além disso, orientações oferecidas ao longo do processo terapêutico, em “doses homeopáticas”, a respeito da melhor maneira de corrigir a criança ou de estimulá-la em sua rotina, podem provocar mudanças de comportamento e na dinâmica familiar que muito ajudarão na evolução da criança.
Sabemos que uma família envolvida no tratamento, que incentiva a criança a comparecer às sessões, a realizar os exercícios em casa e que está atenta em promover a estimulação na rotina da criança, colabora com a qualidade do tratamento e também com a evolução mais rápida.
Desse modo, o desafio do fonoaudiólogo é estabelecer uma comunicação assertiva com a família. Lembrando que cada pai dá um significado diferente para as dificuldades enfrentadas por seus filhos e, por isso, necessitarão de acolhimentos diferentes para, em seguida, compreenderem seu papel no processo terapêutico.
Estabelecer desde o início que todos fazem parte de uma equipe pode ser um bom caminho: fonoaudiólogo, paciente, pais e escola, cada um tem seu modo de contribuir e todos podem se apoiar.
Compartilhar com os pais cada passo de evolução da criança também é um incentivo para persistirem no tratamento. Mostrar aos pais o que a criança não era capaz de realizar e passou a conseguir, ou que realizava em um tempo maior do que faz atualmente, comprova que vale a pena dedicar-se, e a motivação aumenta. Afinal, é muito mais fácil nos motivarmos para algo que está dando certo do que para o fracasso, não é mesmo?
O resultado disso poderá ser uma evolução mais rápida, uma criança que conseguiu superar seu distúrbio e pais mais conscientes de seu papel na educação e no desenvolvimento de seu filho.
Você percebe diferença na evolução dos pacientes que têm uma família engajada no tratamento? Qual sua principal dica para aumentar esse engajamento familiar? Compartilhe sua experiência nos comentários!
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